Aquecimento Global no Alasca
Vladimir Romanovsky atravessa a densa floresta de coníferas com facilidade. Não para ou diminui o passo nem sequer para se equilibrar diante do musgo macio que cobre o permafrost – superfície que permanece congelada nas regiões polares. É um dia quente de julho, e o cientista está procurando uma caixa que ele e sua equipe deixaram no solo. Ela está escondida cerca de 10 quilômetros ao norte do Instituto de Geofísica da Universidade do Alasca, em Fairbanks, onde Romanovsky é professor de geofísica e responsável pelo Laboratório de Permafrost.
O recipiente, coberto por galhos de árvores, contém um coletor de dados conectado a um termômetro, instalado abaixo do solo para medir a temperatura do permafrost em diferentes profundidades. O permafrost é qualquer material terrestre que permaneça a 0°C ou abaixo dessa temperatura por pelo menos dois anos consecutivos.
Romanovsky conecta então seu laptop ao coletor de dados para transferir os registros de temperatura desta localidade, chamada Goldstream 3, que mais tarde serão adicionados a um banco de dados online, acessível tanto para cientistas quanto para qualquer pessoa interessada. “O permafrost é definido com base na temperatura. Esse é o parâmetro que caracteriza a sua estabilidade”, explica o professor.
Quando a temperatura do permafrost é inferior a 0°C, por exemplo, – 6°C, ele é considerado estável, o que significa que vai demorar muito para mudar ou descongelar. Já se está perto de 0°C, é classificado como vulnerável. Todo verão, a porção de solo que cobre o permafrost, chamada de camada ativa, derrete – e congela de novo no inverno seguinte. Em Goldstream 3, naquele dia de julho (verão no hemisfério norte), o derretimento chegava a 50 cm de profundidade.
À medida que a Terra aquece e as temperaturas aumentam no verão, o degelo está se expandindo e ficando mais profundo, fazendo com que o permafrost fique menos estável. Se o derretimento continuar, haverá consequências profundas para o Alasca e para o mundo. Cerca de 90% do Estado é coberto por permafrost, o que significa que vilarejos inteiros precisarão ser realojados, conforme as fundações dos edifícios e as estradas desmoronarem. E se o permafrost liberar o carbono acumulado e retido há milênios dentro dele, poderá acelerar o aquecimento do planeta – muito além da nossa capacidade de controlá-lo.
Freezer Cheio de Carbono
O Alasca, está, sem dúvida na linha de frente das mudanças climáticas, mas as questões relacionadas ao permafrost vão além da “última fronteira selvagem”, como é conhecido. O derretimento do material afetará outros 48 estados americanos, localizados abaixo dele, assim como todo o planeta.
De acordo com Romanovsky, metade do estado e 90% do permafrost do interior do Alasca vão descongelar se houver um aumento médio global de 2°C na temperatura. Isso é especialmente preocupante porque uma enorme quantidade de carbono orgânico é sequestrada no permafrost e na camada ativa que se sobrepõe a ele.
Uma vez que não há calor suficiente no solo congelado para ajudar os micro-organismos a decompor a vegetação morta, a matéria orgânica foi se acumulando durante milhares de anos no permafrost. Algumas análises estimam que a quantidade de carbono no permafrost equivale a mais de duas vezes a de dióxido de carbono na atmosfera.
“Se mantivermos o curso atual, é bem provável que até 2100 uma parte significativa do permafrost, nos cinco metros superiores, descongele. E, com ele, toda a matéria orgânica que está atualmente retida ali”, diz Kevin Schaefer, pesquisador do National Snow and Ice Data Center da Universidade do Colorado.
“Isso significaria uma liberação de dióxido de carbono e metano, que aumentaria o aquecimento devido à queima de combustíveis fósseis.”
Em artigo publicado em 2012 na revista científica Nature, Schaefer e seus colegas sugerem que os eventos de aquecimento súbito ocorridos anteriormente foram essencialmente desencadeados pela liberação de dióxido de carbono e metano do permafrost há cerca de 50 milhões de anos na Antártida.
E as projeções não parecem otimistas: “Teoricamente, se esse carbono for liberado para a atmosfera, a quantidade de CO2 será três vezes maior do que a que está lá (na atmosfera) agora”, diz Romanovsky. Desta forma, há uma genuína retroalimentação, uma vez que o aquecimento aumenta em decorrência da queima de combustíveis fósseis.
Mas, apesar do fato de o aquecimento estar acelerando, os efeitos da retroalimentação serão graduais, levando tempo para serem sentidos. “É um feedback muito lento”, diz Schaefer. “Imagine tentar conduzir um navio a vapor com o remo de uma canoa, esse é o tipo de feedback que estamos falando”, compara.
Infelizmente, uma vez que o permafrost começa a derreter, é difícil congelá-lo novamente – pelo menos enquanto estivermos vivos. Além disso, a partir do momento que material sai do solo e vai para a atmosfera, não existe uma maneira fácil de enviar esse carbono de volta ao chão.