Metamorfoses
Metamorfoses é uma das obras mais famosas e considerada como a magnum opus do poeta latino Ovídio. Este poema narrativo foi tornado público por volta do ano 8 e, ao lado de Fastos, trata-se talvez de um de seus poemas inconclusos por conta do exílio que sofreu no Ponto Euxino, costa do Mar Negro, região distante de Roma. É desconhecida a causa do exílio, mas existem duas hipóteses: ou Augusto não gostou do âmbito de sua obra desde A Arte de Amar, e as Metamorfoses de Ovídio, ao contrário do pensamento de ordem e estabilidade do imperador, mostram um mundo em constante mutação, ou o poeta romano foi indiscreto a respeito de algum aspecto íntimo do soberano ou de sua família.
A estrutura de Metamorfoses constitui-se de 15 livros escritos em hexâmetro dactílico, com cerca de 250 narrativas em doze mil versos compostos em latim. As narrativas transcorrem poeticamente sobre a cosmologia e a história do mundo, confundindo deliberadamente ficção e realidade, narrando a transfiguração dos homens e dos deuses mitológicos em animais, árvores, rios e pedras, representando o princípio dos tempos, chegando à apoteose de Júlio César e ao próprio tempo do poeta, ou seja, o Século de Augusto (43 a.C. - 14 d.C.). Este ciclo histórico apresenta uma mitologia como uma etapa no desenvolvimento do mundo e do homem. Ovídio segue o conceito de Hesíodo e nos mostra as quatro idades cronológicas da mitologia clássica (medida como a Idade do Ouro, a Idade de Prata, a Idade do Bronze e a Idade do Ferro). Aproveitando a abordagem das Eras do Homem, Ovídio une deuses e mortais em histórias de amor, incesto, ciúme e crime.
Contemporâneo de Horácio e Virgílio, Ovídio deu novo acabamento literário aos mitos gregos que haviam sido aproveitados pelo Império Romano quando esse conquistou a Grécia. Poetas como Homero e Pausânias foram de importância fundamental para sua inspiração. Embora os personagens sejam mitológicos, o caráter de seus diálogos e contos é permeado pela humanidade. Em Metamorfoses, ele popularizou os mitos mais famosos e lembrados da mitologia grega, tais como os de Midas, Orfeu, Eros, Psiquê, Zeus, Afrodite, Baco e Narciso. Outro aspecto apresentado em seu poema é o caos, a confusão de todos os elementos que se supõe ter precedido a criação do universo, que o poeta se refere em latim como rudis indigestaque moles ("massa informe e confusa").
Metamorfoses de Ovídio permanece até hoje como um dos trabalhos poéticos mais aclamados sobre mitologia e o poema mais influente da história da poesia e da arte — poucas obras poéticas inspiraram tantas formas artísticas como a literatura, a música, a arquitetura e a pintura. Seu caráter social e espiritual acerca dos ciclos históricos do homem influenciou também a filosofia, notavelmente o Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens (1989), de Jean-Jacques Rousseau. Preservado pelo gosto da cultura ocidental através dos séculos, inspirou, entre outros autores, Dante, Shakespeare, Franz Kafka, Fernando Pessoa (Bernardo Soares), Cruz e Sousa e Manoel de Barros, além de pintores ou escultores tão diversos como Michelangelo, Rafael, Tiziano, Correggio, Veronese, Caravaggio, Rubens, Bernini, Velásquez, Rembrandt e Delacroix. Figura, portanto, como uma das mais importantes obras clássicas da mitologia greco-romana e da literatura latina.