Interação Mãe-Bebê em Contexto de Depressão Materna: Aspectos Teóricos e Empíricos
O Puerpério como Contexto das Primeiras Interações
O puerpério, como outras fases do ciclo vital, é um período propenso a crises, devido às mudanças físicas e psicológicas que o acompanham (Maldonado, 2000). Segundo Stern (1997), a nova mãe precisa ajustar o centro de sua identidade, de filha para mãe e, às vezes, de profissional para mãe de família. Essa reorganização é essencial para que ela possa redirecionar seus investimentos emocionais, seu tempo, energia e atividades. Stern descreve essa nova organização psíquica como a “constelação da maternidade”, que emerge com o nascimento do bebê. Para Winnicott (1978), neste período, a mulher entra em um estado especial de "preocupação materna primária", um estado de sensibilidade aumentada que a capacita a cuidar de seu bebê.
Neste momento, a mãe precisa desenvolver uma identificação com seu bebê, imaginando o que ele necessita e se colocando em seu lugar (Granato & Aiello-Vaisberg, 2003). Aiello-Vaisberg e Granato (2002) ressaltam que a mãe precisa sobreviver aos desafios impostos pelo bebê, como ataques de cólera, indiferença, recusa de alimentação ou falta de sono. Esse estado especial ajuda a mãe a renunciar aos próprios interesses para cuidar do bebê. Além disso, o nascimento pode reativar problemas antigos da mãe, ainda não totalmente elaborados (De Felice, 2000), pois o puerpério é uma fase propícia a crises emocionais (Maldonado, 2000; Stern, 1997; Szejer & Stewart, 1997).
Tipos de Transtornos Emocionais no Pós-Parto
Entre os transtornos emocionais no pós-parto, destacam-se a melancolia da maternidade (baby blues), a psicose puerperal e a depressão.
A melancolia da maternidade é um estado reativo, não sendo considerado depressão propriamente dita, e pode ocorrer devido a mudanças neurofisiológicas no puerpério (Miller, 1997). Esse quadro afeta entre 70% e 90% das puérperas (Dunnewold, 1997; Szejer & Stewart, 1997). Já a psicose puerperal é uma condição psiquiátrica rara e grave, normalmente exigindo internação (O'Hara, 1997).
Depressão Materna e Suas Características
A depressão, foco deste estudo, afeta cerca de 10% das puérperas e pode levar de seis semanas a até três ou quatro meses para se manifestar (Cooper & Murray, 1995; Dunnewold, 1997; O'Hara, Zekoski, Phillips, & Wright, 1990). Sua etiologia é complexa, envolvendo fatores genéticos, estressores psicológicos, contexto cultural e mudanças fisiológicas. Alguns estudos sugerem que a depressão materna pode surgir em qualquer momento do primeiro ano de vida do bebê, permanecendo fortemente associada à maternidade (Beck, 1991; Brown, Lumley, Small & Astbury, 1994; Klaus, Kennel & Klaus, 2000; Murray, Cox, Chapman & Jones, 1995).
Recentemente, a literatura destaca que não há grande distinção entre depressões que afetam mães de crianças pequenas ao longo do primeiro e até do segundo ano de vida da criança (Beeghly, Weinenberg, Olson, Kernan, Riley & Tronick, 2002; Cooper, Campbell, Day, Kennerly & Bond, 1988; Cox, Murray & Chapman, 1993). No entanto, O'Hara (1997) aponta que nem a psicose puerperal nem a melancolia da maternidade são consideradas patologias específicas pelo DSM-IV ou CID10. No presente estudo, optou-se pelo critério do DSM-IV, que define depressão pós-parto como um episódio de depressão maior ocorrido nas quatro primeiras semanas após o parto. A depressão que afeta as mães após esse período, especialmente durante o primeiro ano, será chamada de depressão materna.
Cronicidade e Sintomas da Depressão Materna
A depressão pode durar de seis meses a um ano (Parry, 1997), sendo que os episódios de depressão pós-parto geralmente têm duração similar a outros episódios depressivos fora do contexto do puerpério (O'Hara, 1997). Os sintomas da depressão materna ao longo do primeiro ano incluem alterações no apetite e sono, dificuldade para dormir após amamentar, crises de choro, desatenção, problemas de concentração, falta de energia e perda de interesse em atividades que antes eram prazerosas (Dunnewold, 1997). Também podem ocorrer pensamentos suicidas e sentimentos de culpa. Esses sintomas, geralmente duradouros, prejudicam as atividades cotidianas da mulher (O'Hara, 1997).
Embora a depressão materna no primeiro ano de vida do bebê tenda a ser leve (O'Hara, Neunaber & Zekoski, 1984; Steiner & Tam, 1997; Whiffen & Gotlib, 1989), mesmo sintomas leves podem impactar negativamente a nova mãe. Durante o pós-parto, espera-se que a mulher se sinta feliz com a chegada do bebê (Maldonado, 2000). Segundo Steiner e Tam (1997), o fato de a depressão ser leve ou moderada frequentemente dificulta o diagnóstico, podendo evoluir para um quadro severo, que exige internação. Para Maldonado (2000), a severidade da depressão relaciona-se com a frustração de expectativas ligadas à maternidade, ao papel materno e ao tipo de vida estabelecido com o nascimento da criança.